domingo, 23 de maio de 2010

Exame II, Grupo I, Afirmação I

"O Código de Processo Administrativo afasta inequívoca e definitivamente a necessidade recurso hierárquico, como pressuposto de impugnação contenciosa de actos administrativos.” (Vasco Pereira da Silva)

Esta afirmação vai de encontro com uma das questões mais discutidas na doutrina e que se prende com a necessidade, ou não, de existir recurso hierárquico necessário para impugnação contenciosa de actos administrativos.

Trata-se de uma discussão envolvida pela história do próprio contencioso administrativo, uma vez que, para ser possível a propositura de uma acção de impugnação do acto, seria sempre necessário que este fosse definitivo e executório, ou seja, que pondo termo ao procedimento administrativo, esse acto viesse a decidir uma situação jurídica, individual e concreta, culminando-a nos planos horizontal, vertical e material.

O primeiro passo para a resolução deste problema, foi dado pela visão constitucional de 1989, em que se alterou a redacção do art.284º/4 CRP, passando a constar do mesmo que, para a possibilidade de se recorrer contenciosamente, seria apenas necessária a efectiva lesão de direitos e interesses legítimos dos seus destinatários. No entanto, esta alteração não foi vista como consagração do direito a impugnação do acto lesivo, de modo directo e imediato, uma vez que continuava a ser constitucionalmente permitido impor o esgotamento dos méis de tutela graciososa.

Não obstante ao que foi dito, a mudança de todo o paradigma adveio da reforma levada a cabo relativamente ao Processo administrativo, especialmente no que respeita ao art.51º/1 do CPTA. Existem, no entanto, autores que defendem haver situações em que o recurso hierárquico continua a ser necessário. Os Professores Vieira de Andrade e Aroso de Almeida, são exemplo disso. Defendem que, havendo alguma menção expressa em Decreto-Lei sobre recurso hierárquico obrigatório, este é definitivamente necessário, uma vez será um regime especial face a um outro geral. Este regime geral, previsto no CPTA veio trazer a desnecessidade em todos os outros casos (não existe nenhuma disposição equivalente art.34º da LPTA e a lei não faz qualquer referência ao requisito da definitividade) por força dos arts.51º/1 e 59º/4 e 5 do CPTA. Seguindo o raciocínio destes Doutores, ao CPTA não cabe a revogação de inúmeras denominações legais avulsas que vêm instituir impugnações administrativas necessárias (estas só desapareceriam por força de disposição expressa que assim o determinasse).

Posição completamente oposta, é a adoptada pelo Prof. Vasco Pereira da Silva que defende acerrimamente a tese da inconstitucionalidade do recurso hierárquico necessário. Na linha de raciocínio do Professor, deixou de fazer sentido o recurso hierárquico, uma vez que a sua finalidade era a de permitir a impugnação do acto administrativo, possibilidade essa que se consagrou (depois da reforma) sempre possível, de forma imediata, independentemente do recurso a tutela graciosa e do seu efeito suspensivo. Deste modo, não fará sentido algum que se mantenha o recurso hierárquico necessário (uma vez que hoje será sempre desnecessário). Refuta, ao longo do seu discurso, as teses de Vieira de Andrade e de Aroso de Almeida, no que toca à parte da “especialidade das regras”. Os argumentos que utiliza para tal, são os seguintes:

- se assim fosse, seria então forçoso concluir que, antes da reforma, tais normas ditas “especiais” não possuíam especialidade alguma, já que eram apenas a confirmação ou a reiteração da “regra geral” da impugnação hierárquica necessária;

- se o CPA agora estabelece que garantia prévia não é mais um pressuposto processual, isso significa que a exigência do recurso hierárquico em normas avulsas deixa de ter consequências contenciosas, pelo que se deve considerar que (pelo menos, nessa parte) tais normas caducam pelo desaparecimento das circunstâncias de direito que as justificavam.

Quanto a nós, entendemos que a razão se encontra com o Prof. Vasco Pereira da Silva, uma vez que, atendendo à lei (mais precisamente, ao art.59º/4 do CPTA) é possível existir impugnação contenciosa durante a pendência da apreciação da impugnação hierárquica (graciosa).

Karenina Koch, n.º 15917
Sub-turma 10

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