sexta-feira, 2 de abril de 2010

Tema 2-Mudam-se os tempos mudam-se as vontades.



Promotores de projecto do Largo do Rato querem 18 milhões de indemnização
30 Outubro 2009
Os técnicos e responsáveis pelos departamentos da Câmara de Lisboa por onde passou o processo do polémico edifício projectado para o Largo do Rato divergem quanto à obrigatoriedade de plano de pormenor e deram pareceres contrários.
Segundo o histórico do processo na autarquia - feito no relatório do grupo de trabalho nomeado para reanalisar os casos urbanísticos apontados pela sindicância -, o caso teve início a 27 de Janeiro de 2005, com um pedido de licenciamento para obra de construção. A exigência de um plano de nível inferior (pormenor ou urbanístico) foi uma marca dos pareceres dos responsáveis do Departamento de Gestão Urbanística/Divisão Gestão Zona Sul e das informações técnicas elaboradas.
O projecto de arquitectura do edifício proposto para o Largo do Rato, entre a Rua Alexandre Herculano e a do Salitre, acabou por ser aprovado a 22 de Julho de 2005. Depois, já com o executivo liderado por António Costa, o processo de licenciamento foi chumbado duas vezes (em Julho e Novembro de 2008). Os promotores avançarem com um processo em tribunal contra cada um dos 11 vereadores que votaram contra (todos menos o PS) e pedem 18 milhões de euros de indemnização.
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O tema da legitimidade em processo administrativo é um dos temas mais actuais e que ganha a maior importância com a recente evolução verificada nas relações jurídicas administrativas. Sendo a legitimidade definida, como se pode ler no artigo 9º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA de aqui em diante), em função da participação ou não do autor na relação material controvertida, pretendemos com este trabalho reflectir um pouco sobre a evolução recente dessa mesma relação material controvertida, e os problemas que essa evolução tem colocado em termos de legitimidade activa e passiva do processo administrativo. De facto, cada vez mais a relação jurídica administrativa deixou de ser uma relação bilateral (Administração/Particular), para passar a ser uma relação polarizada ou multilateral, afectando não só os sujeitos da relação jurídica vertical (Administração/particular), mas também os sujeitos das relações jurídicas horizontais, conexas com essa mesma relação vertical (Administração/outros órgãos da Administração; Particulares/ outros particulares afectados, etc.).
Colocámos a notícia que acima se pode ler, por entendermos que está intimamente relacionada com a matéria de que aqui vamos tratar, tentando assim fazer um exercício de hermenêutica jornalística amadora, entre a notícia e a matéria da qual tratamos. Pegando exactamente nessa notícia, nela se relata que os promotores de determinada construção, vêem agora exigir uma indemnização à Câmara Municipal de Lisboa face ao gigantesco prejuízo que já devem ter acumulado em razão de dois chumbos consecutivos do projecto de arquitectura que pretendem construir naquela zona para a qual obtiveram licença de construção. Será interessante ver, como este problema tem ainda resquícios dos traumas de infância aos quais a nossa Administração também não escapou ilesa.
Como já acima referimos, a legitimidade enquanto pressuposto processual, tem como razão de ser a preocupação de trazer a juízo os titulares da relação jurídica controvertida e é a concepção que se tenha dessa mesma relação jurídica que vai determinar o modo como os terceiros possam ou não participar nela. Num primeiro momento, em que a Administração mantinha com os particulares uma relação marcada pela autoridade e consequente subjugação dos administrados a essa mesma posição de supremacia, e onde não eram reconhecidos direitos aos particulares em face da Administração, a relação jurídica administrativa não deixava margem para mais sujeitos que não fossem a Administração e o sujeito particular directamente lesado na sua esfera jurídica por alguma actuação da Administração. Felizmente, a evolução constitucional operada colocou os direitos fundamentais num patamar de irreversibilidade onde já não são defensáveis posições que neguem a existência de direitos dos administrados face à Administração, sob pena de se atentar contra a dignidade da pessoa humana. No entanto, isso não impede que haja várias posições sobre o tipo de poder (chamemos-lhe assim por falta de termo melhor e mais genérico) que o particular pode invocar junto da Administração. A discussão não é assim tão simples e tem raízes mais profundas, na própria concepção de direito fundamental de cada autor; não queremos entrar de forma tão densa na discussão mas vamos procurar trazê-la para o que aqui nos importa, sintetizando o máximo possível a sua explicação. Na nossa doutrina a distinção entre direitos fundamentais e figuras afins tem encontrado terreno bastante fértil, para dar apenas uma ideia das opiniões dominantes podemos dizer que hoje em dia, quase todos os autores, fazem a distinção entre direitos subjectivos e interesses legítimos. Tal orientação dominante é perfeitamente compreensível face: 1º : ao próprio texto constitucional, que no artigo 268º nº4 garante aos administrados a tutela dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, 2º : ao artigo 55º nº 1 a) do CPTA, e por último o próprio artigo 57º do CPTA que nos vai ser especialmente útil no desenvolvimento do tema, que também usa as duas expressões em uníssono. Assim, encontramos autores como o Prof. Freitas do Amaral, que explica a distinção com base no facto de os direitos subjectivos resultarem de forma imediata da lei, enquanto que nos interesses legítimos o poder de vantagem do individuo é atribuído apenas de forma reflexa; ou ainda o Prof. Rui Machete que explica a diferença dizendo que no caso dos direitos subjectivos a sua efectivação não está dependente de nenhuma actuação administrativa, enquanto que nos interesses legítimos a sua efectivação estaria dependente do exercício do poder administrativo. Revolucionária e inovadora nos parece ser a posição do Prof. Vasco Pereira da Silva em relação a esta matéria, devemos confessar que, enquanto estudada na disciplina de Direitos Fundamentais, a sua teoria da norma de protecção nos fazia relutar um pouco pelo excesso de subjectivismo que poderia estar contido na interpretação do âmbito de aplicação da norma, uma vez aplicada ao processo administrativo ela parece fazer todo o sentido, uma vez que cumpre na plenitude a função de bálsamo ou terapia para os traumas de infância de que a disciplina padece ajudando-a a tornar-se um adulto saudável. Ora vejamos: o particular será titular de um direito subjectivo face à Administração, sempre da norma jurídica resulte um direito, uma protecção do seu interesse, uma vantagem para o particular ou um beneficio de facto decorrente de um direito fundamental. Quanto a esta última situação que o Prof. entende ainda estar abrangida pelo conceito de direito subjectivo, insurge-se o Prof. Rui Machete dizendo que esses interesses de facto só podem ser tutelados uma vez subjectivados através da participação dos seus titulares no procedimento administrativo, e que para tal contribui o conteúdo do artigo 53º do Código de Procedimento Administrativo, que “abre” o procedimento a terceiros não titulares de direitos subjectivos. Cabe dizer aqui que tal não é uma tutela suficiente nem satisfatória, uma vez que nem todas as situações susceptíveis e serem apresentadas em juízo têm forçosamente atrás de si um procedimento administrativo. De modo que não chega fazer uma distinção entre direito subjectivo e interesse legítimo, importa antes modificar o próprio conceito de relação jurídica administrativa e adaptá-lo aos nossos dias, isso evitará muitos conflitos e contribuirá para a o equilíbrio neste “jogo de soma zero” que são as relações entre a Administração e os particulares, em que alguém vai ter sempre de ficar a perder para que outro ou outros interesses prevaleçam. Atentemos de novo no caso apresentado para melhor ilustrar a situação: Temos aqui o caso paradigmático, sobejamente discutido na doutrina alemã, no qual uma câmara municipal concedeu uma licença de construção a um determinado promotor, sem ouvir os ouros particulares, que também seriam afectados pela situação, nomeadamente os vizinhos e moradores da zona. É certo que o artigo 53º do CPA considera que terceiros interessados no procedimento podem nele intervir, mas todos sabemos que a população portuguesa não tem como hobby as questões cívicas, e muito menos o direito do urbanismo, seria legitimo impedir que esses terceiros pedissem em tribunal a anulação da concessão da licença de construção, porque uma vez que não participaram no procedimento, podendo fazê-lo, os seus interesses não foram subjectivados? A resposta parece ser negativa.
Uma última palavra para explicar o fracasso na doutrina alemã do acto administrativo de duplo efeito, teoria desenvolvida por Laubinger. O acto administrativo de duplo efeito seria aquele acto que cria um direito a favor de determinada pessoa mas simultaneamente atinge um direito de outra. No entanto, a doutrina acabou por concluir que esse acto não servia para tutelar cabalmente as posições de todos os atingidos, uma vez que nesse mesmo acto não se reconhecem os direitos de terceiros, como por exemplo não consta de uma licença de construção o direito do vizinho
à fiscalização da obra.
Concluindo, podemos dizer que no nosso ordenamento houve uma franca evolução no sentido de reconhecer o carácter multilateral das relações jurídicas administrativas, e que hoje em dia esse carácter multilateral está espelhado na previsão da legitimidade passiva de cada acção como resulta dos artigos: 10º n1, 57º e 68º nº2 do CPTA. E na forma de legitimidade activa: artigo 9º nº 2, 55º nº1 f) e 68º nº1 f) do mesmo diploma. Apesar desta previsão específica, devemos fazer uso da teoria da protecção da norma, para que os terceiros deixem de ser terceiros e passem a ter um papel de parte principal na acção.
Tarefa 1: Evolução histórica do modelo de contencioso administrativo no D. Português

No que diz respeito à evolução do modelo do contencioso administrativo, na perspectiva organizativa, cumpre destacar três grandes etapas:
1ª que respeita à época liberal
2ª que vai desde 1930- 1976
3ª que corresponde à fase posterior à CRP de 1976

Para marcar o início da história do contencioso administrativo, normalmente invoca-se o período em que se instaura a separação de poderes. Contudo, cumpre lembrar que mesmo antes desta altura já existiam mecanismos de tutela perante os poderes públicos.
Na verdade, a autora Maria da Glória García ( da justiça administrativa em Portugal. Sua origem e evolução, Lisboa, 1994) dá-nos conta de terem existido diversos mecanismos de protecção durante a época medieval, a época moderna e a época do Estado de polícia.
A Doutrina considera decisivo, ainda assim, o marco da revolução francesa. Durante a época liberal, e sobretudo a partir de 1832, concretiza-se entre nós o modelo de justice retenue. Na senda da reforma de Mouzinho da Silveira, que pressupõe que julgar a Administração é ainda administrar, institui-se um sistema administrativista. Este período não apresenta, contudo, traços contínuos e limpos. E assiste-se à combinação constante de modelos. Por exemplo, durante a vigência do CA, há a mitigação do modelo, já que se estabelece uma diferença entre a justiça local ( Conselhos de Prefeitura) e a justiça central( Conselho de Estado).
Durante a época do período autoritário- corporativo, que vai desde 1930/33 a 1974/76, existiu entre nós um modelo quase- judicialista, assentado nas auditorias administrativistas, a nível local, e no STA, a nível central, sendo certo que tais órgãos eram independentes, não estando integrados na orgânica dos tribunais comuns.
Finalmente, a terceira fase inicia-se com a actual Constituição. Assim, importa sublinhar que a CRP de 1976 veio instituir um modelo judicialista, ou seja, um modelo de contencioso totalmente jurisdicionalizado, sendo que a jurisdição administrativa surge como ordem jurisdicional autónoma ainda que de competência especializada.
Com a revisão de 1989, os tribunais administrativos passam a ter uma existência obrigatória, integrados numa ordem judicial a que compete a jurisdição comum em matéria administrativa: art.209º/1, alínea b) e 212º/3 CRP, sendo certo que também se consagram garantias de autonomia e de imparcialidade aos juízes administrativos ( art. 212º/1 e nº2; art.216º), bem como de auto- governo da respectiva magistratura.
Neste sentido, pode concluir-se que, em termos organizativos, a justiça administrativa começou por ser um modelo administrativista ( embora não puro), transitou para um modelo quase- judicialista e finalmente foi transformado num modelo judicialista, sendo certo que esta evolução teve avanços e recuos.
Quanto à evolução do modelo processual ( ou operativo) do contencioso administrativo, é necessário precisar que as revisões constitucionais e as alterações introduzidas pelo legislador ordinário dão conta de uma clara tendência de subjectivização do contencioso administrativo. No quadro da CRP de 1976, o contencioso administrativo é ainda predominantemente objectivista, sendo certo que mantém ainda a característica do contencioso iniciado em 1832. Todo ele consubstancia o talhe francês, assentando num recurso de anulação, que é um recurso de mera legalidade. Caracteriza-se também por serem reduzidos os poderes de condenação por parte do tribunal, pelo excesso de formalismos e por ser ampla a margem da Administração na execução de julgados. Além disso, a Administração tem um tratamento desigual enquanto parte no processo. Ainda assim, importa sublinhar que neste período foi publicado um importante diploma: o Decreto- Lei nº 256-A/77, que vem reforçar sobretudo as garantias dos particulares em matéria de execução de sentenças.
No quadro da CRP, após a reforma de 1982, é dado um passo no sentido da subjectivização do contencioso administrativo, dado o alargamento do âmbito da justiça administrativa e da intensificação da protecção das posições subjectivas. E, nessa sequência, surge a reforma de 1984/1985, com a publicação da LPTA e do ETAF. Na LPTA acolhe-se a acção para reconhecimento de direitos, o contencioso dos regulamentos e as acções não especificadas e dois meios acessórios de intimação, uma para comportamentos e outro para prestação de informações.
No quadro da CRP, após a reforma de 1989, há uma nítida acentuação do carácter subjectivo do modelo, pela possibilidade de recurso contra actos lesivos, pela possibilidade de tutela de posições jurídicas substantivas e pela consagração do direito dos particulares à tutela jurisdicional efectiva.
Finalmente, no quadro da CRP, após a revisão de 1997, a tendência subjectivista sai definitivamente reforçada. Acolhe-se a pretensão de condenação à prática de acto devido e acolhe-se a possibilidade de requerer providências cautelares adequadas. E depois de alguma passividade do legislador ordinário, em 2002/2003, é adoptado o CPTA e o ETAF, procurando concretizar o direito fundamental dos cidadãos à tutela jurisdicional efectiva e em prazo razoável. E, na realidade, depois da revisão constitucional de 1997, e na sequência das alterações introduzidas com a revisão de 1989, ficou clara a necessidade de o legislador ordinário intervir no sentido de positivar todas as garantias que a Lei Fundamental atribui aos cidadãos perante a Administração, incluindo as de acesso à tutela jurisdicional efectiva e em prazo razoável para obter a protecção dos seus direitos e interesses legalmente protegidos: o reconhecimento de direitos, a impugnação de qualquer acto lesivo, a adopção de providências cautelares e a impugnação de normas. A norma constitucional, “ motor da evolução” do sistema processual, exigiu ao legislador ordinário uma reforma: uma reforma profunda, que veio a acontecer em 2002, com a publicação do ETAF e do CPTA. ´
Neste quadro normativo concretizador da CRP, prevê-se que os tribunais administrativos, que são os realizadores da justiça administrativa, sejam tribunais competentes para dirimir “ os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas”. E consagra-se o princípio da tutela jurisdicional efectiva, que compreende “ o direito de obter, em prazo razoável, uma decisão judicial que aprecie, com força de caso julgado, cada pretensão regularmente deduzida em juízo, bem como a possibilidade de a fazer executar e de obter as providências cautelares, conservatórias ou antecipatórias destinadas a assegurar o efeito útil da decisão( art. 2º/1CPTA). E para que não haja dúvida sobre a plena jurisdição dos tribunais administrativos, o art. 2º/2 CPTA enumera quais são as pretensões possíveis de realizar junto dos tribunais administrativos às quais vem responder os poderes declarativos, constitutivos, condenatórios, preventivos e executivos do juiz, que apenas esbarram com os espaços discricionários da Administração.
O modelo engloba um domínio de jurisdição declarativa ( contencioso declaratório) e um domínio de jurisdição de execução( contencioso de execução). Através deste contencioso procede-se à plena execução de sentenças, sendo que este assume três modalidades: execução para prestação de facto e entrega de coisas, pagamento de quantias certas e execução de sentença anulatória. No domínio do contencioso declaratório inclui-se o modelo declaratório ordinário, desdobrável nas duas formas processuais de acção administrativa comum e a acção administrativa especial, e o modelo urgente. O modelo do contencioso urgente permite a decretação de providências de fundo para certas situações específicas de urgência e permite a adopção de qualquer medida cautelar ( provisória) que seja adequada a proteger a utilidade das sentenças de fundo. O sistema permite a cumulação de pedidos em termos gerais e especificamente no domínio da acção administrativa especial. As regras sobre legitimidade processual continuam a ter um traço de clara inspiração objectivista, sendo, portanto, alargada.
E o Ministério Público mantém um conjunto de poderes que usa para fiscalização da legalidade, tendo, no entanto, visto reduzidos os seus poderes.


Ariana Cardoso nº 15666 subturma 10

A Problemática do Interesse enquanto condição de Legitimidade

As dúvidas acerca das condições de legitimidade surgiram com o Código de 1886, que introduziu uma nova técnica, considerando a par da ofensa - via de recurso, a ofensa - condição de legitimidade. Através desta técnica a possibilidade de recorrer foi aparentemente restringida, uma vez que o Código de 1878, no art. 107º, considerava competentes para requerer a revogação contenciosa das deliberações municipais inquinadas de nulidades ou ofensivas, o administrador do concelho e as partes interessadas, parecendo que com tal expressão o acesso aos tribunais fosse alargado. No entanto, com o Código de 1886, esse mesmo poder só expressamente se conferiu ao Ministério Público e às pessoas cujos direitos fossem ofendidos pelas deliberações, de acordo com o art. 122º.
Em face das circunstâncias políticas e sociais, a jurisprudência francesa procedeu a um alargamento do conceito de legitimidade. Citando Hauriou, o Professor Marcello Caetano considerava a qualificação do interesse como a condição de legitimidade do recorrente: interesse directo, pessoal e legítimo. Posteriormente, Marcello Caetano voltou a analisar o conceito de legitimidade fundado na detenção de um especial interesse do recorrente perante o objecto do recurso, o qual reforçava o entendimento de que esse interesse devia ser qualificado. Não seria bastante qualquer interesse, no contencioso administrativo francês, para legitimar o reclamante ou recorrente, antes o Conselho de Estado exigia que o interesse fosse directo, pessoal e legítimo.
O interesse seria Directo quando o provimento do recurso implique a anulação de actos jurídicos que constituam obstáculo à satisfação da pretensão anteriormente formulada pelo recorrente, ou sejam causa imediata de prejuízos infringidos pela administração. O interesse deve ser imediato, o que significa que este não deve ser eventual mas actual, e que a anulação do acto deve acarretar uma satisfação imediata ao recorrente, não a uma satisfação longínqua.
O interesse será Pessoal quando o recorrente seja o seu próprio titular, ou seja, a pessoa em cujo património, em cuja carreira, em cuja esfera jurídica ou actividade se vá produzir o efeito da anulação pretendida. Portanto, tem de existir uma relação de titularidade entre a pessoa (singular ou colectiva) do recorrente e a pretensão por cuja vitória se pugna ou o prejuízo causado pelo acto cuja anulação se requer. Este requisito distinguia o recurso contencioso da acção popular, pois o interesse que o justifica deve provir duma situação jurídica particular.
E seria Legítimo se decorre-se do facto do seu titular haver sido desfavorecido no processo em que foi praticado ou se for objecto de protecção jurídica, mesmo indirecta. Mais tarde, a noção de interesse legítimo passou a ser entendida como a utilidade proveniente do recurso que não seja reprovada pela ordem jurídica.
Portanto, existia interesse directo, pessoal e legítimo sempre que o recorrente particular pudesse retirar da decisão favorável do tribunal uma vantagem ou utilidade imediata não reprovada pelo Direito, para a sua própria esfera jurídica.
O Professor Freitas do Amaral desdobra o interesse nesses três requisitos, que têm que se verificar cumulativamente para preencher o pressuposto da legitimidade do recorrente. O interesse será directo quando o benefício resultante da anulação do acto recorrido tiver repercussão imediata no interessado, será pessoal quando a repercussão da anulação do acto recorrido se projectar na própria esfera jurídica do interessado, e será legítimo, quando é protegido pela ordem jurídica como interesse do recorrente.
O Professor Vasco Pereira da Silva desenvolve a posição segundo a qual a legitimidade não se coloca ao nível do interesse, mas sim da lesão de um direito substantivo próprio. O carácter pessoal, directo e legítimo do interesse é assim uma decorrência lógica da posição substantiva de vantagem no âmbito da relação jurídica administrativa. O interesse pessoal traduz-se na alegação de um direito da esfera jurídica do particular, o qual foi lesado por uma conduta ilegal da administração, sendo que a legitimidade do interesse consubstancia-se na atribuição desse direito àquele sujeito pela ordem jurídica. Esta concepção da legitimidade no contencioso administrativo assegura a ligação entre a realidade material substantiva e a relação processual, fazendo com que os participantes no recurso sejam os sujeitos efectivos da relação material, negando uma concepção que pretenda substituir-se à consideração das situações jurídicas substantivas das partes e basear-se num critério exclusivo de determinação do acesso ao juiz.
A legitimidade activa, no âmbito da impugnação de actos administrativos vem hoje tratada no art. 55º do CPTA. O critério do interesse determina a legitimidade - art. 55º, nº1, alínea a) -, em conexão com o princípio da lesão efectiva. Na determinação da legitimidade activa, o legislador preferiu retirar o qualificativo do interesse legítimo, bastando-se com a titularidade de um interesse directo e pessoal. A esta supressão não será estranha a própria subjectivização da acção, e já em 1933 o Dr. Fezas Vital criticava a exigência do carácter legítimo do interesse.
A supressão dos elementos da definitividade e executoriedade do acto como requisitos de procedibilidade abonam, também, a favor da dispensabilidade de uma noção de interesse legítimo, uma vez que este existe mesmo não se produzindo um acto com aquelas características classicamente entendidas. Não concorre para a definição da legitimidade do interesse a qualificação de acto definitivo e executório, mas apenas a de acto administrativo lesivo - havendo lesão, há interesse.
Portanto, a legitimidade é configurada como um pressuposto processual, para o qual é irrelevante a sustentação da detenção do interesse na relação material controvertida, com abstracção da procedência ou não do pedido. A questão da titularidade efectiva da posição subjectiva deve ser excluída do âmbito da construção do instituto da legitimidade processual. A alegação do direito é condição suficiente para a verificação do pressuposto processual, que se basta com a aparência da lesão do direito ou interesse. Por fim, é parte legítima, no âmbito da impugnação de actos lesivos, todo aquele que alegar a lesão da sua posição jurídica substantiva, no âmbito de uma relação jurídica administrativa, mesmo sem demonstrar a existência efectiva e concludente desse direito ou desse interesse.

Marisa Ribeiro dos Santos 16781 subturma 6


quinta-feira, 1 de abril de 2010

Tarefa 2: Legitimidade Processual

A legitimidade processual é um pressuposto processual (numa definição simplista, mas assertiva, os pressupostos processuais são todos os requisitos necessários para que o tribunal possa proferir uma decisão) através do qual a lei através de certos requisitos, define os sujeitos de cada processo judicial.

Quanto à legitimidade activa, a lei atribui-a, em regra, àquele que alegue ser parte numa relação material controvertida (art. 9º CPTA), isto é, basta a alegação da titularidade do direito, uma vez que saber se ele é ou não titular do direito é algo que se vai saber já no próprio processo.

Já a legitimidade passiva irá ser aferida em função de contra quem deverá ser proposta a acção (art. 10º CPTA). Por isso, poderemos dizer que será o autor, em função do seu pedido, que conformará a relação jurisdicional administrativa.

Numa palavra, a legitimidade decorre da alegação da posição de parte numa relação material controvertida, tem que haver assim uma ligação entre a relação material/substantiva e a relação processual/adjectiva.

É com a intervenção dos particulares, individualmente considerados, que o contencioso administrativo assume a sua função predominantemente subjectiva. Contudo esta função subjectiva não é a única, dado que tem a seu lado uma importante função objectiva, de tutela da legalidade e do interesse público, que é realizada de forma mediata pela acção de defesa de direitos, e de forma imediata através da intervenção do actor público e do actor popular (art. 9/2 CPTA).

O art. 9º CPTA distingue entre uma legitimidade para a defesa de interesses próprios, que tem lugar sempre que o sujeito alegue ser parte numa qualquer relação administrativa material controvertida, e uma outra legitimidade que cabe a todos os indivíduos, pessoas colectivas, autarquias locais e MP, “independentemente de terem interesse directo na demanda” (art. 9/2 CPTA) para a tutela objectiva dos bens e valores da ordem jurídica, defendendo a legalidade e o interesse público.

Quanto à legitimidade passiva, o critério passa também pela relação material controvertida, considerando-se como partes as entidades públicas, mas também os indivíduos ou pessoas colectivas privadas, sujeitos às obrigações e deveres simétricos dos direitos subjectivos alegados pelo autor.

Até aqui vimos a questão numa perspectiva de uma relação entre dois sujeitos, um de cada lado, contudo há que ter em conta, no contencioso administrativo actual, a existência de relações multilaterais e dessa forma permitir-se o chamamento a juízo de todos os titulares da relação material controvertida, para que possa haver coincidência entre relação material e relação processual.

Aquando da reforma do contencioso administrativo, o legislador parece, apesar da sua tendencial e superior preocupação com as relações bilaterais, ter tido em conta as relações multilaterais e a necessidade de fazer intervir em juízo todos os sujeitos. Prevê-se, então, a possibilidade da ocorrência de situações de pluralidade de partes que correspondem às figuras gerais do litisconsórcio e da coligação.

Há litisconsórcio quando todos os pedidos são formulados por todas as partes (activo) ou contra todas as partes (passivo): há unicidade do pedido, assim como é unitária a relação jurídica substancial em litígio. Segundo o Prof. Vieira de Andrade, o art. 10/8 CPTA prevê mesmo um litisconsórcio necessário passivo nas pretensões dirigidas contra uma entidade pública, entre essa entidade e outra(s), cuja colaboração seja exigida pela satisfação de tais pretensões.

Quanto à coligação, esta existe quando cada um dos pedidos seja formulado por cada um dos autores (activa), ou contra cada um dos réus (passiva). Há então uma pluralidade de pedidos, logo uma pluralidade de relações materiais controvertidas, embora exista uma conexão entre si. O CPTA permite ainda a coligação de vários autores contra um ou vários demandados, assim como a conjugação de pedidos diferentes por um autor contra vários demandados, nos casos do art. 12º CPTA (e 30º CPC).

Enfim, apesar do contencioso administrativo ter na sua base e como sua função principal a tutela de interesses particulares (função subjectiva), há que ter cada vez mais em conta a propensão do contencioso administrativo para a sua função objectiva de defesa da legalidade e do interesse público. E ainda a ultrapassagem do paradigma das relações bilaterais entre administração e particulares; para uma progressiva multiplicação de interesses e relações multilaterais e com a consequência de o contencioso administrativo e a sua legislação se terem de adaptar, de forma a que haja coincidência entre os sujeitos da relação material controvertida e os sujeitos da relação processual (veja-se a possibilidade de litisconsórcio e de coligação, e do art. 48º CPTA que regula os chamados processos de massa, que são processos que envolvem uma multiplicidade de sujeitos, mas que dizem respeito à mesma relação jurídica material, e em que estão em causa idênticos fundamentos de facto e de direito).


Inês Santos Morais (nº 16641)

Turma A

Subturma 12


Tarefa 1

Até aos séculos XVII e XVIII, vigorou na Europa o chamado sistema tradicional de contencioso administrativo, sendo que este sistema veio a influenciar decisivamente os “primeiros anos de vida” do contencioso administrativo, principalmente em França, como veremos adiante.

Durante séculos e até ao final do absolutismo, “reinou” então na Europa o sistema tradicional da justiça administrativa, sem separação de poderes e sem Estado de Direito. Quanto ao primeiro aspecto, não é demais relembrar que o Rei (e restantes autoridades) era simultaneamente o supremo administrador e supremo juiz, isto é, existia uma indiferenciação total das funções administrativa e jurisdicional. Relativamente ao segundo ponto, vivia-se uma época em que os particulares eram tidos meros objectos nas mãos e à disposição do poder executivo, dado que à não subordinação da Administração Pública à lei, estava associado um sistema de fracas garantias jurídicas dos cidadãos face à Administração.

Contudo, não se pode negar que mesmo nesta época já existiam certas regras com carácter jurídico que vinculavam e “controlavam” a actuação da Administração, só que estas eram regras avulsas às quais faltava necessariamente uma ideia de sistema, e as poucas regras existentes podiam ser afastadas por razões de conveniência administrativa, dadas as particularidades da própria actuação administrativa que não pode, sob quaisquer circunstâncias, ser comparada com a actuação e relação de um particular com um particular.

Com efeito, é a concepção de Estado do Antigo Regime que vai influenciar decisivamente a concepção de contencioso administrativo uma vez que há que, em primeiro lugar, concentrar e unificar o poder do Estado, e só num segundo momento, quando o Estado já for suficientemente forte, poderá haver uma organização política que garanta a liberdade e os direitos dos cidadãos.

Este panorama foi alterado a partir de 1688, com a grande Revolução em Inglaterra e com a Revolução Francesa em 1789, apesar de os “cortes com o passado” não terem sido tão radicais como à partida se poderia pensar, nomeadamente em França. O papel destas revoluções liberais não pode, todavia, ser menosprezado. Assim, passou-se lentamente de um sistema administrativo tradicional, para os sistemas administrativos modernos, que se baseiam na separação de poderes e no Estado de Direito, ainda que a interpretação destes dois princípios não tenha sido, principalmente em França, a mais correcta e adequada à protecção dos interesses e direitos dos cidadãos.

Começando, em termos cronológicos, com o sistema de tipo britânico (ou de administração judiciária) verificamos que a sua evolução é muito menos conturbada do que a do sistema francês. A separação de poderes implicou então que cada um dos poderes fosse tomado como autónomo e independente, limitando-se reciprocamente. Assim, a administração estava subordinada aos tribunais e às regras de direito comum. Todavia, mais tarde, e pela evolução natural das “coisas”, compreendeu-se que a sujeição, na teoria perfeita, da Administração aos tribunais e regras de direito comum, levava, na prática, a que o sistema apresentasse um conjunto de condicionamentos e limitações que podem pôr em causa a eficácia do sistema, assim se explicando o surgimento posterior de “órgãos administrativos especiais” (os administrative tribunals), a quem são atribuídas tarefas jurisdicionais no que diz respeito ao controlo da actividade administrativa, mas também tarefas administrativas propriamente ditas, por isso, a natureza mista destes órgãos – meio administrativos/meio judiciais.

O próprio Rei ficou impedido de intervir em matérias de cariz contencioso, ficando ele próprio subordinado ao Direito e aos tribunais (comuns). Se o próprio Rei estava subordinado aos tribunais, natural se torna que a Administração (que em Inglaterra é largamente descentralizada) também estivesse sujeita aos tribunais comuns (courts of law). Segundo o Prof. Marcello Caetano não faria sentido isentar a administração desta sujeição aos tribunais comuns dado que “só há uma medida de direitos para todos […], um só sistema para o Estado e para os particulares”. Não devem, por isso, haver soluções distintas para as situações que apenas envolvam os particulares e para aquelas em que esteja também envolvida a administração. Em consequência verificamos que, por via de regra, a administração não dispõe de prerrogativas ou privilégios de autoridade pública e se existirem, tais prerrogativas são vistas como excepções ao rule of law e não como um sistema de regras de Direito Administrativo.

O elemento principal (e distintivo) deste sistema será, todavia, a impossibilidade de a administração executar as suas decisões por autoridade própria, isto é, as decisões unilaterais da AP não têm força executória própria, o que quer dizer que se o particular não as acatar voluntariamente, elas não podem ser coactivamente impostas sem uma intervenção do poder judicial (sendo que este poder está “desligado” dos interesses administrativos).

De tudo o que foi exposto decorre que os particulares dispõem de um grande conjunto de garantias contra ilegalidades e abusos da administração.

Passando agora ao sistema francês (ou de administração executiva), que influenciou de forma decisiva o “nosso contencioso”, verificamos que a Revolução Francesa, apesar de ter tido um papel importante, não trouxe assim tantas rupturas, nomeadamente nos primeiros anos seguintes, ao nível do contencioso administrativo.

Assim, o contencioso administrativo foi concebido como “privilégio de foro” da Administração, que existia não tanto para garantir a protecção dos interesses dos particulares, como para garantir a defesa dos poderes públicos. Há aqui uma ligação indesmentível entre as tarefas administrativas e de julgar, ao mesmo tempo que se proibia a interferência dos tribunais judiciais na esfera da administração, em nome da separação de poderes.

Contudo, a interpretação feita pelos revolucionários franceses do referido princípio foi errada, uma vez que entenderam que “julgar a administração é ainda administrar”, mas julgar a administração já não seria julgar. Logo, em nome de uma ideia de separação de poderes criou-se (ou manteve-se) uma confusão entre o poder de julgar e o de administrar. Esta concepção da separação de poderes é “apoiada” por Montesquieu para quem o poder judicial pune os crimes ou julga os litígios dos particulares, logo os litígios administrativos nunca poderiam pertencer aos tribunais.

Os revolucionários procuraram também com a criação de um contencioso especial reagir contra a actuação dos tribunais numa fase terminal do Antigo Regime, a actuação destes tribunais foi tal que se chegou a falar num “governo de juízes”, e assim se evitava que os tribunais pudessem colocar entraves à actuação da Administração, que agora se encontrava em “boas mãos”.

A criação de órgãos administrativos especiais, destinados ao julgamento de litígios administrativos, vem também do Antigo Regime, e é a tentativa de proteger e defender a administração que vai justificar a criação de órgãos administrativos especiais, como o Conselho de Estado (inspirado no Conselho do Rei, durante o Antigo Regime), onde mais uma vez se denota que o contencioso administrativo é também uma herança do Antigo Regime. As próprias técnicas e instrumentos jurídicos da administração mantêm-se antes e depois da Revolução.

Com efeito, estamos perante uma fase do contencioso em que o administrador e juiz tenderão a coincidir, daí que o Prof. Vasco Pereira da Silva fale no “pecado original” da ligação da administração à justiça, havendo consequentemente uma isenção judicial da administração.

O período do modelo do administrador-juiz durou muito tempo, tendo tido diversas fases, sendo que a mudança de sistema para o dos tribunais administrativos ainda não chegaria (isto pelo menos até 1889, ano do Acórdão Cadot). Contudo, a jurisdicionalização plena da jurisdição administrativa não se pode reconduzir a um único momento, ela resulta de um longo processo evolutivo que se caracteriza pelo progressivo afastamento da justiça administrativa da administração propriamente dita para se aproximar dos tribunais (ainda que esses tribunais sejam de jurisdição administrativa). É o aprofundamento da noção de Estado de Direito, associada ao Estado social, que vem exigir que os diferendos entre a administração e os particulares sejam julgados por verdadeiros tribunais.

O sistema francês, ou de administração executiva, distancia-se do britânico principalmente no que diz respeito ao privilegio da execução prévia, que permite à administração executar as suas decisões por autoridade própria, sem intervenção de um órgão judicial como acontece em Inglaterra, isto é, a administração dispõe de poder para, por si, empregar meios coactivos para o respeito da sua decisão.

Segundo o Prof. Freitas do Amaral podemos distinguir o sistema britânico e o francês com base em vários traços específicos de cada um. Em Inglaterra temos uma unidade de jurisdição já que a Administração está sujeita aos tribunais comuns e os tribunais têm amplos poderes de injunção face à Administração, que lhe está subordinada aos tribunais como a generalidade dos cidadãos, sendo que o direito aplicável nos tribunais é direito comum. E as decisões administrativas não têm força executória própria. Já em França há (em resultado de uma longa evolução) uma dualidade de jurisdições uma vez que a Administração está hoje sujeita aos tribunais administrativos, e o direito aplicável é o Direito Administrativo, que é direito público, sendo que os tribunais só podem anular decisões ilegais ou abusivas ou condenar a administração no pagamento de indemnizações. As decisões da administração têm autoridade própria, dispensando a intervenção do tribunal.

Resumindo, estamos na presença de dois modelos, e como modelos que são, estão sujeitos à evolução dos tempos, e eles próprios têm caminhado no sentido de algumas aproximações. Há, assim, dois sistemas que, apesar de diferentes, foram caminhando no sentido de uma progressiva harmonização, a qual se deve, em grande medida, à integração horizontal das ordens jurídicas dos Estado membros. Com efeito, esta convergência de sistemas de contencioso administrativo – sem nunca pôr em causa as respectivas especificidades – é o ponto de partida de um novo Processo Administrativo Europeu, que esperamos possa romper completa e decisivamente com os “traumas do passado”, aproveitando o melhor de cada sistema de forma a permitir uma efectiva realização da Administração e sua justiça, bem como a promover, qualitativa e quantitativamente, as garantias e direitos dos particulares, uma vez que estes ainda se poderão encontrar, “aqui e ali”, em situação de inferioridade injustificada face à Administração.


Inês Santos Morais (nº 16641)

Turma A

Subturma 12


A Legitimidade no Contencioso Administrativo

Os preceitos processuais específicos do Contencioso Administrativo e também comuns a todos os meios processuais como é o caso da legitimidade, entre outros, constam Código de Processo dos Tribunais Administrativos, ou doravante designado CPTA. É de destacar aqui a legitimidade visto ser a matéria que em questão nos interessa estando, assim, prevista nos arts. 9º e seguintes do já referido CPTA.

Quanto a estes preceitos respeitantes aos pressupostos parece pouco coerente a lei (ou o legislador mais concretamente) não ter diferenciado efectivamente o que era comum e o que era especial o que leva à existência de uma repetição do que já tinha sido previsto nos termos gerais, uma tal situação pode levar a uma confusão, pode causar problemas ao intérprete e aplicador do Direito, no que respeita a saber, o que está a ser repetido ou o que é realmente novo, dando origem a um regime especial.

Deixando de parte problemas mais abrangentes, como o acima referido, foquemo-nos agora na questão da legitimidade, sendo que esta é a ligação entre a relação jurídica substantiva e a processual, a ligação entre o problema efectivo entre a Administração e a outra parte a ser resolvido nos tribunais, podendo ser suscitado por quem de direito, ou seja, a legitimidade destina-se a trazer a juízo os titulares da relação material controvertida, a fim de dar sentido útil às decisões dos tribunais.

Como já foi referida a repetição existente no CPTA, além das disposições gerais, existe ainda uma Subsecção II (Da Legitimidade) a propósito da acção administrativa especial qualificada em razão do pedido da impugnação, onde se estabelece um regime "especial" (o que não difere muito da parte "geral", criando-se assim a repetição). Nesta subsecção encontram-se regras relativas à legitimidade, existindo assim uma separação entre legitimidade activa (art. 55º CPTA) e legitimidade passica, que nesta subsecção aparece como "contra-interessados" (art. 57º CPTA). Ainda nesta parte do Código aparece a "aceitação do acto" que, em rigor, não é uma questão de legitimidade, o que será discutido mais adiante.

No art. 55º CPTA é feito, em diversas alíneas, a enumeração das categorias de actores processuais que serão agora examinadas.
Em primeiro lugar, temos os sujeitos privados, em causa está o exercício do direito de acção por privados,, que actuam para a defesa de interesses próprios e podem ser:


A) Os indivíduos que tenham interesse "directo e pessoal" na demanda por terem sido lesados pelo actos nos seus direitos ou interesses legalmente protegidos. Os individuos devem alegar a titularidade de um direito subjectivo (art. 9º CPTA), sendo esta uma noção ampla de direito subjectivo público, pois este conceito integra, não só o direito subjectivo (em sentido estrito), mas também os interesses legítimos e osinteresses difusos (visão tripartida).

B) As pessoas colectivas privadas (art. 55º/2 b) CPTA), estas são entidades ficcionadas para efeitos juridicos mas dotadas de direitos e deveres tal como os individuos acima referidos. Contudo, apesar desta assimilação aos indivíduos, as pessoas colectivas são uma realidade instrumental para a realização de interesses das pessoas humanas estando, deste modo, submetidas ao principio da especialidade, isto é, apenas "gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres compatíveis com a sua natureza", art. 12º2 CRP.


Em segundo lugar, temos as pessoas colectivas públicas (art. 55º/2 b) e e) CPTA). Quanto a estas, os sujeitos públicos tanto podem ser as pessoas colectivas públicas, como os órgãos administrativos (ou seja, há as relações jurídicas interpessoais e interorgânicas).


Depois destas, há que enumerar o actor popular, isto é, a legitimidade através da acção popular, que por sua vez tem duas engloba duas modalidades (que geram certos problemas/ questões, que serão referidas):


A) Acção Popular Genérica (art. 55º/1 f) CPTA que remete para o art. 9º/2 do mm Código): esta engloba particulares e pessoas colectivas actuando, de forma objectiva, para a defesa da legalidade e do interesse público, não sendo necessário que estes tenham interesse directo na demanda.


B) A Acção Popular de Âmbito Autárquico (art. 55º/2 CPTA): segundo esta qualquer eleitor, no gozo dos seus direitos civis e políticos, pode impugnar as deliberações adoptadas por órgãos das autarquias locais sediadas na circunscrição onde se encontrem recenseados. Esta é também conhecida como acção popular "correctiva".


É aqui que surge um dos problemas ou questões importantes, é assim, necessário saber se esta dualidade de acções populares (genérica e de âmbito autárquico) se justifica, ou se, pelo contrário, a acção genérica seria suficiente uma vez que o seu âmbito mais abragente abrangeria também as questões autárquicas.
De acordo com o Professor Vasco Pereira da Silva, tal como descreve no seu manual "O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise", a acção correctiva caduca perante a acção popular genérica, uma vez que esta última tem requisitos de admissibilidade mais amplos que absorvem os anteriores, ou seja, quando se refere aos sujeitos como "qualquer pessoa", está a abranger necessariamente "qualquer eleitor"; quando se refere a bens (bens e valores constitucionalmente protegidos), abrange, desta forma, os bens e valores autárquicos; por fim, quando se refere ao âmbito de aplicação, a acção popular genérica abrange toda e qualquer decisão administrativa e por isso, também, as dos órgãos autárquicos.


Finalmente, quanto aos actores processuais, há ainda que referir o Ministério Público que é também ele titular de acção pública no Contencioso Administrativo, actuando a título institucional, para a defesa da legalidade e do interesse público.


Estando, então, enumerados os actores processuais activos anunciados do CPTA, cumpre agora dar atenção a outras problematicas. No que diz respeito ao art.57º CPTA ("contra-interessados" ou actores passivos), este qualifica como sujeitos processuais os particulares dotados de "legítimo interesse" na manutenção do acto administrativo, ou dito de outra forma, que são "directamente prejudicados" pelo provimento do pedido de impugnação. Estes particulares são verdadeiros sujeitos de relações juridicas administrativas multilaterais, as quais, para além da Administração e dos destinatários imediatos da actuação administrativa em causa, dão origem a uma "rede" de ligações juridicas entre multiplos sujeitos, uns do lado activo, outros do lado passivo, que são titulares de posições de vantagem juridicamente protegidas, pelo que devem gozar dos corresp0ndentes poderes processuais.
Ao considerar que, nos processos de impugnação, os sujeitos das relações multilaterais, com interesses coincidentes com os da autoridade autora do acto administrativo, são obrigatoriamente chamados a intervir no processo, o CPTA está a abrir o Contencioso Administrativo à protecção desses direitos "impropriamente chamados de terceiros". Estes "terceiros" têm assim, através do Código uma posição de segundo plano, ou seja, a expressão "contra-interessados" e o seu papel não definido de modo rigoroso pelo CPTA está a secundarizar o lado passivo.
Este novo paradigma das relações administrativas multilaterais do Direito substantivo Administrativo deveria implicar uma revalorização destes sujeitos passivos, devendo a sua designação de "terceiros" ser alterada, passando a sujeitos principais dotados de legitimidade, uma vez que o Código assim o obriga e também porque na prática estes sujeitos não são meros terceiros. Ainda de reparar que nas regras gerais estes sujeitos não recebem tratamento, não recebem qualquer atenção, nem a eles se faz referência.

Problema ainda a ter em atenção é o que diz respeito à aceitação do acto administrativo que aparece na Subsecção II ao lado das regras da legitimidade, quando, em rigor, este pressuposto nada está relacionado com a legitimidade (art. 56º CPTA). A questão que aqui se coloca não é actual, mas vem já desde o inicio, desde a formação do Contencioso Administrativo, sendo portanto, um problema antigo e não, propriamente, moderno e actual. Tradicionalmente, a aceitação do acto era considerada uma questão de legitimidade e não de interesse em agir, pois era negado aos particulares a titularidade de direitos subjectivos perante a Administração (como aliás já foi tratado a proposito da tarefa 1 proposta pelo professor) e qualificava-se a legitimidade processual em termos de "interesse directo, pessoal e legítimo" tomando-se esse interesse como condição necessária para a existência de legitimidade, que funcionava como sucedâneo das posições subjectivas cuja existência, como já se disse, não se admitia, a consequência de tudo isto era a não consideração do interesse em agir como pressuposto processual autónomo.
Portanto, o legislador, nesta altura em que são reconhecidos direitos e interesses legalmente protegidos aos particulares, de forma plena, deveria rever a aceitação do acto na organização e estrutura do CPTA. Como tal ainda não foi feito, o problema subsiste, ou pelo menos teoricamente, deste modo, um de dois caminhos há que percorrer, ou se considera que a aceitação do acto contitui um pressuposto processual autónomo, o que significa solução diferente do seu reconhecimento como legitimidade ou interesse em agir (como refere Vieira de Andrade) ou, por outro lado, se reconduz tal aceitação à falta de interesse processual. O professor Vasco Pereira da Silva, acompanhando Vieira de Andrade na separação da aceitação do acto do pressuposto da legitimidade, não vê quaisquer vantagens em reconhecer a aceitação do acto como pressuposto autónomo, parecendo-lhe ser mais apropriada a recondução da questão ao interesse em agir, em termos similares ao processo civel.

Está, então, feita a referência à legitimidade e aos problemas que dela advêm,uns mais contemporâneos e outros mais tradicionais, não tendo ainda nenhum deles uma solução legal, ficando esta tarefa nas mãos do intérprete e aplicador do Direito.

Inês Guisadas

Nº: 16958

Turma: A / Subturma: 9

Tarefa 2: Legitimidade Processual - Velhos e Novos Problemas

Depois de termos estudado Processo Civil e de termos batalhado para tentar perceber as questões da legitimidade, uma primeira leitura dos arts. 9º e 10º do CPTA, não nos causou qualquer estranheza. Tal como no Processo Civil, o Contencioso Administrativo estabelece a legitimidade em função da relação material controvertida.

Mas, como já nos temos vindo a aperceber, tudo o que existe hoje no Contencioso Administrativo não "nasceu" necessariamente assim, antes percorreu um longo caminho, ultrapassando sucessivos obstáculos. A problemática da legitimidade não é excepção.

Tal como todo o Contencioso Administrativo, esta questão surgiu no modelo francês (que já aqui explicitámos), demonstrando uma lógica clássica, segundo a qual o Contencioso Administrativo era do tipo objectivo, era um "processo ao acto", "à mera verificação da legalidade de uma actuação administrativa", citando o Professor Vasco Pereira da Silva, na sua obra O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise; todo o processo girava em torno do acto administrativo, que era "tudo e todas as partes" (Nigro). Isto significava que o particular nunca ia ao processo defender um seu interesse. A sua presença suscitava-se apenas para colaborar com o tribunal na defesa da legalidade e do interesse público. Tal como a Administração, que estava em juízo como "autoridade recorrida", auxiliando o tribunal. Mas isto resultava da já tratada, promiscuidade entre Administração e a Justiça - tanto o tribunal como a Administração prosseguiam o mesmo fim, integrando-se, ambos, no poder do Estado. Tal como referia Marcelo Caetano (na obra Príncipios Fundamentais do Direito Administrativo), "o interesse da Administração é o mesmo que o do tribunal, está interessado no cumprimento preciso, inteligente, adequado,oportuno da lei".

A promiscuidade foi afastada, em Portugal, com a Constituição de 1976, que integrou o Contencioso Administrativo no Poder Judicial. Ainda assim, o legislador continuava a referir-se à Administração como "autoridade recorrida".

Hoje, o legislador é claro nos arts. 9º e 10º do CPTA, tanto o particular como a Administração são partes no processo administrativo. Além do queestá também consagrada a igualdade de participação no processo. É assim afastado o modelo objectivista. O particular pode agora estar em juízo para defesa dos seus direitos subjectivos, das posições substantivas de vantagem no âmbito da relação jurídica administrativa. Consagra-se ainda a possibilidade de acção pública e de acção popular (art.9º/2). Desta forma, o Contencioso Administrativo português é predominantemente subjectivo (art.9º/1), mas é também objectivo, assentando também na defesa da legalidade e interesse público (9º/2).

No que diz respeito à legitimidade passiva, a Administração é também demandada para "defesa de uma determinada interpretação da legalidade e do interesse público".

Apesar da evolução, subsistem alguns problemas na questão da legitimidade. Em primeiro lugar, é importante chamar a atenção para o facto de o legislador dar preferência à pessoa colectiva pública como sujeito passivo. Como refere o Professor Vasco Pereira da Silva, na obra já referenciada, " a noção de pessoa colectiva pública não parece estar mais em condições de poder continuar a funcionar como único sujeito de imputação de condutas administrativas, em razão da complexidade da organização administrativa e da natureza multifacetada das modernas relações administrativas multilaterais", antes há que considerar as autoridades administrativas. E, apesar da preferência do legislador, este parece também ter querido estabelecer uma certa abertura, no sentido de se autonomizar as diversas autoridades administrativas como sujeitos processuais, como se pode verificar pela leitura dos seguintes arts. : desde logo consagrou no art. 10º/2 uma excepção relativamente ao Estado; o art. 10º/4, parece também consagrar a regra alemã "segundo a qual quem deve estar em juízo é a autoridade administrativa responsável pelo comportamento litigado, ainda que se possa fingir que o faz em representação da pessoa colectiva"; por fim, o art. 10º/6 confirma todo este raciocínio.

Outro problema surge com a questão da multilateralidade das relações administrativas: hoje em dia, a relação entre a Admnistração e os particulares não é, em regra, bipolar, colocando-se então a questão de saber "em que medida é que, num processo intentado pelo autor contra uma determinada autoridade administrativa, devem também ser chamados a juízo os demais sujeitos da relação multilateral, de modo a que o tribunal possa considerar todos os interesses em causa e emitir uma sentença produtora de efeitos em relação a todos os intervenientes da relação jurídica material". Perante esta situação, apesar de ainda não se verificar uma tendência relativamente às relações multilaterais, o legislador consagrou algumas regras relevantes neste âmbito: art. 12º (coligaçã0), art. 48º (processos em massa), art. 57º (contra-interessados).
Contudo, há ainda um longo caminho a percorrer nesta matéria, quer pela doutrina, jurisprudência e também pelo legislador.

Para terminar, resta-nos apenas referir que, para que o Contencioso Admnistrativo se "livrasse" da promiscuidade que o caracterizou nos seus primeiros anos, não podia auto-intitular-se como um "processo ao acto", antes tendo que se demonstrar como um processo de partes: de um lado o particular, do outro a Administração, perante um terceiro, o juiz.

Cátia Martins, subturma 12
16554

Tarefa 2:O processo administrativo será um processo de actos ou de partes?

Uma discussão que vem à muito no processo administrativo é se este consiste num processo de actos ou de partes.
Situando-nos no direito português, podemos caracterizá-lo, hoje em dia, como um processo de partes. Mas antes de tudo, teremos que ir aos primórdios da discussão, para entendermos o problema.
De acordo com a lógica clássica, como a doutrina refere, o contencioso administrativo nasceu, no direito francês, destinado à verificação da legalidade de uma actuação administrativa, ou seja, como o Prof. Vasco Pereira da Silva refere, a integralidade do processo gravitava em torno do acto administrativo. Como o processo administrativo se caracterizava assim, podemos dizer que nem o sujeito particular nem a administração pública eram considerados como partes, estando estes em juízo somente para "ajudar" o tribunal na defesa da legalidade e do interesse público.
A maneira como a administração pública via o particular era de uma forma um pouco objectivada, pois este seria um mero objecto para a prossecução do interesse público, como Hariou refere, a posição do particular era a de um "ministério público, efectuando a repressão de uma infracção".
Digamos que neste período conturbado do contencioso administrativo, este seria um pouco actocênctrico, pois preocupa-se exclusivamente com o interesse público e consequentemente com os privilégios autoritários da administração, negando direitos subjectivos aos particulares.
Existia como que uma ideia (deveras utópica), que o particular estaria em juízo com um intuito altruísta na defesa da legalidade. Podemos, em suma, dizer que existia uma visão objectivista do processo administrativo.
Outra curiosidade desta doutrina clássica, era o facto de não obstante se negar ao particular o estatuto de parte, este também era negado à administração, pois esta estava em juízo para auxiliar o juiz na tarefa de estabelecer a legalidade e o interesse público. A razão desta configuração estava no facto de o juiz não ser um terceiro, mas sim mais um elemento da administração, e, como ilustram as palavras de Marcello Caetano "o interesse da administração é o mesmo que o do tribunal, está interessado no cumprimento preciso, inteligente, adequado, oportuno da lei".
Em Portugal, o modelo objectivista que via o processo administrativo como um processo de actos só foi afastado pela constituição de 1976, pois integrou a justiça administrativa no poder judicial.
Hoje em dia podemos dizer que código de procedimento administrativo já tem uma visão subjectivista do objecto do processo, sendo este um processo de partes e não de actos. No artigo 6º o código, além de consagrar a regra de que a administração e particulares são partes, refere também que estes estão em igualdade na sua participação processual, estabelecendo ainda que as partes devem cooperar com os magistrados a fim de obter a adequada resolução dos litígios (art.8º), podendo ainda ser condenadas por litigância de má fé (art.6º). Não obstante estes artigo do CPTA, é preciso também referir que na constituição portuguesa estabelece-se que a justiça administrativa visa também (e até podemos dizer preferencialmente) a tutela dos direitos dos particulares (arts. 209º e 268º/4).
Cabe ainda explicitar que, a ideia que o processo administrativo é um processo de partes encontra-se ainda demonstrado nas regras comuns acerca da legitimidade (arts. 9º e ss), pois, como refere o Prof. Vasco Pereira da Silva, "(...) os problemas da ilegitimidade encontram-se indissociavelmente ligados aos da qualidade de parte".
Em termos sumários, quais podem ser as vantagens e desvantagens de um objecto de processo objectivista ou subjectivista?
Quanto ao primeiro podemos referir que um processo de actos oferece garantias mais amplas de defesa da legalidade, pois, como refere o Prof. Vieira de Andrade, com este modelo a legalidade é há uma melhor defesa, principalmente em extensão, pois vai alargar a legitimidade para o acesso aos tribunais, seja contra actos individuais, seja contra normas.
Outro argumento a favor do processo administrativo como um processo de partes, é o facto de a finalidade da justiça administrativa ser assegurar a juridicidade da actividade administrativa, não se reduzindo à tutela dos particulares.
Podemos ainda referir que, outro argumento favorável é o facto de se ter de acautelar o interesse público, pois a actuação administrativa é muitas vezes favorável aos particulares e podem existir a concessão de vantagens ilegais ou ilegítimas por parte da administração.
Por último, como o Prof. Vieira de Andrade refere, o modelo objectivista apresenta como vantagem o facto de administração pública como poder não ter só potenciais privilégios, mas sim limitações e deveres a favor dos administrados.
A favor do modelo subjectivista podemos referir o grande argumento, que é o facto de este oferecer uma protecção maior, ou se quisermos, mais intensa aos particulares que sejam tutelares de direitos perante a administração, tendo este protecção uma importância cada vez maior, pois o intervencionismo estatal cresce cada vez mais, mesmo que as formas de intervenção sejam diferentes do passado, o que pode acabar por violar direitos subjectivos dos particulares.

Vítor Fidalgo, A5, 16915

quarta-feira, 31 de março de 2010

Licenciadas que não realizaram exame foram admitidas a estágio na Ordem dos Advogados

O Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa considerou válidas as alegações das duas jovens licenciadas em Direito que intentaram acção de intimação para a protecção de direitos liberdades e garantias, e obrigou a Ordem dos Advogados a admiti-las provisoriamente no estágio profissional sem fazerem o exame nacional de acesso marcado para dia 30 de Março.
 Como todos sabemos foi desde início constestada esta nova medida da O.A que vinha impor uma diferenciação entre aqueles que concluíram os seus estudos antes ou depois do, ora aclamado, ora amaldiçoado, Processo de Bolonha. Entre outros argumentos estará em causa, segundo as autoras, a violação do princípio da igualdade (art.13º CRP), a par da desproporcionalidade da medida restritiva imposta (art.18º CRP) bem como a defesa de um direito, liberdade e garantia – o de acesso livre à
profissão de advogado (artigo 47º da CRP). Quanto às questões suscitadas acerca da impugnação do Regulamento Nacional de Estágio (RNE), agora no que respeita à sua (i)legalidade, não deixa de suscitar curiosidade desde logo que a O.A se defenda, por exemplo, dizendo que o Conselho Nacional de Estágio se limita a fazer uma interpretação do exposto no regulamento e, assim sendo, não estamos perante um
regulamento nem um acto administrativo, pelo que tal norma não é sequer impugnável.
  Acontece, porém, que não tendo a decisão eficácia senão no caso concreto, (pelo menos neste primeiro momento, sem prejuízo de futuramente se poder chegar ao Tribunal Constitucional e só aí sim com força obrigatória geral, julgando-se incostitucional a norma contida no art.9º A do regulmento de acesso ao estágio da O.A), todos os demais licenciados compareceram para prestar a respectiva prova de acesso.
 Aguardam-se novos acontecimentos, nomeadamente o recurso por parte da O.A.

Link da decisão do Tribunal: http://www.inverbis.net/images/stories/pdf/tacl_estagioordemadvogados.pdf



Patrícia Oliveira, Subturma 9, nº 15284

Processo administrativo como processo a um acto ou como processo de partes: vantagens e inconvenientes dos dois modelos

Existem dois modelos de justiça administrativa nos sistemas de administração executiva, um modelo objectivista e um subjectivista. O confronto entre eles baseia-se em diversos critérios, entre eles: a função do contencioso (procura principalmente a defesa da legalidade ou a tutela de direitos dos particulares?) e o objecto do processo (é um processo feito a actos ou julga-se a lesão das posições jurídicas subjectivas do administrado?).
O modelo que preponderou no continente europeu foi o chamado “modelo francês”, caracterizado, entre outras aspectos, por um regime processual fundamentalmente objectivista, que considerava o recurso de anulação como “um processo feito a um acto”, projectado para fiscalizar a legalidade do exercício autoritário de poderes administrativos, em que os particulares têm a função de auxiliar a legalidade, desde que interessados no resultado. O domínio central do contencioso administrativo comum é composto pelo recurso de anulação de decisões administrativas, que tende a ser de mera legalidade, sucessivo (pressupõe decisão administrativa anterior) e limitado (porque o juiz só pode anular o acto, não tem poderes de decisão plenos, e porque há dificuldades em obter a execução das sentenças contra a administração).
O chamado “modelo alemão”, instaurado depois da II Guerra Mundial na Alemanha, traz a ideia de uma protecção judicial plena e efectiva dos administrados, reflectindo um modelo fundamentalmente subjectivista. Propugna, entre outras coisas, o desenvolvimento de meios de acção de jurisdição plena quando esteja em causa a lesão de direitos dos cidadãos, independentemente da prática de actos administrativos, deixando de se colocar o recurso contencioso de anulação como o núcleo essencial do sistema. Procura também a acentuação dos aspectos subjectivistas no processo administrativo, enquanto processo de partes, ao nível da legitimidade, uso dos meios cautelares, efeitos da sentença, poderes e deveres das partes, limites do caso julgado, execução das decisões judiciais.
Tentando fazer um balanço de vantagens e desvantagens dos modelos, podemos afirmar que a evolução dos sistemas aponta para uma subjectivização da justiça administrativa devido à provada insuficiência dos modelos objectivistas clássicos para garantir uma protecção judicial efectiva dos direitos dos particulares, cuja relevância cresceu intensamente com o alargamento da intervenção administrativa nas esferas da vida social. Mas não se deve esquecer que ambos os modelos possuem vantagens e inconvenientes pois, se ninguém nega que o modelo subjectivista protege mais fortemente os administrados titulares de direitos perante a Administração, deve admitir-se que o modelo objectivista fornece garantias mais amplas de defesa da legalidade, principalmente em extensão, pois tende a alargar a legitimidade de acesso aos tribunais, quer contra actos individuais, quer contra normas, seja na acção particular, seja na acção colectiva, pública e popular. Um dos pontos fracos do modelo subjectivista verificado na Alemanha é a inexistência da figura da acção popular como figura geral, admitida agora como acção de grupo em determinadas áreas, e o reconhecimento fortemente limitado da acção pública, apenas para a impugnação directa de normas.
Mesmo no âmbito dos direitos dos particulares, o modelo objectivista possui algumas vantagens, uma vez que o reconhecimento da Administração como poder implica também a existência de especiais deveres e limitações que funcionam em favor dos administrados, como o ónus da prova, por exemplo. Mas, por outro lado, esta concepção faz do acto administrativo o ponto central, o contencioso preocupa-se quase exclusivamente com a anulação do acto, concebendo o recurso de anulação como um “processo feito a um acto” (HARIOU), que não pressupõe de nenhuma forma a existência de direitos subjectivos do particular. A dogmática do Estado de Direito, ao encarar a lei como o principal instrumento de garantia dos direitos dos cidadãos, desvaloriza os direitos subjectivos. Estamos perante um contencioso objectivo em que tudo gira em volta do acto administrativo; este é, nas palavras de Vasco Pereira da Silva, “pressuposto, objecto, parte única, meio de prova, medida da sentença…”. Ora, o acto administrativo, numa primeira fase, gozava de total isenção de controlo jurisdicional. No Estado liberal, é visto como privilégio da Administração, como acto unilateral cujos efeitos são susceptíveis de imposição coactiva aos administrados, como expressão de um poder público desenvolvido no sentido da actuação agressiva.
Uma das orientações da doutrina que defendia o não reconhecimento de direitos subjectivos dos particulares nas relações administrativas fundamentava a sua posição afirmando que o recurso de anulação era visto como um processo feito a um acto, em que o particular não defendia posições jurídicas próprias. Esta concepção implica que o particular não defende nenhum direito no processo, nem age como parte em sentido material, sendo apenas um mero auxiliar da Administração, colaborando na procura da decisão administrativa mais conforme à lei e tendo apenas um interesse material na anulação do acto ilegal. O particular desempenha o papel de um Ministério Público, nas palavras de Hauriou, pois o interesse que tem coincide com o interesse da boa administração. Para Guicciardi, o cidadão recorre para tutela do interesse público e aproveita da ocasional coincidência, com este último, do seu interesse pessoal, agindo assim como súbdito ao serviço de uma Administração toda-poderosa.
A passagem do Estado liberal para o Estado social significou o fim da época áurea do conceito clássico de acto administrativo, forçado agora a enfrentar realidades diversas daquelas para as quais tinha sido criado. O acto administrativo não desapareceu, mas o Estado social impôs uma mudança de paradigma da Ciência do Direito Administrativo, pelo que o acto administrativo perdeu a sua posição de monopólio nas relações administrativas, tornando-se uma forma de actuação entre muitas. A passagem para uma Administração prestadora traz consigo a multiplicação das formas de actuação administrativa, correspondentes às novas funções que a Administração é chamada a desempenhar. As relações entre a Administração e o particular complexificam-se, intensificam-se, tornando-se, em muitos casos, duradouras.
Neste âmbito, surgem críticas à noção de acto administrativo que, devido ao seu carácter estático, seria incapaz de explicar a dinâmica das novas formas de actuação da Administração. Alguns autores propõem mesmo a substituição do conceito de acto administrativo como conceito central pelo de relação jurídica, como forma de ultrapassar o dualismo Administração agressiva vs. Administração prestadora. Outra orientação propõe como novo conceito central para o Direito Administrativo o procedimento. A concepção do acto administrativo como centro de gravidade tornou-se inadequada, pois ele é apenas um momento do complexo relacionamento entre Administração e particular, cuja existência é anterior e posterior àquele, e que não se esgota nessa actuação pontual. Ele fundamenta, cria ou põe termo a uma relação jurídica mas há muitas outras que se fundamentam, modificam ou terminam de uma forma distinta do acto administrativo.
A mudança de natureza da actividade administrativa influenciou o próprio modo de conceber o acto administrativo. Desvaloriza-se o elemento autoritário e passa-se a valorizar a ideia de uma actividade administrativa dirigida à satisfação de necessidades colectivas, democratizando esta manifestação de poder através da processualização da actividade administrativa e da participação legitimadora do cidadão no processo de tomada de decisão.
A importância do instituto da relação jurídica, nomeadamente quando se estabelecem relacionamentos duradouros entre o particular e as entidades administrativas, não impossibilita que o acto administrativo continue a destacar-se como relevante manifestação do poder da Administração e, provavelmente, a mais lesiva dos direitos dos particulares. Estas duas figuras não se excluem reciprocamente, complementam-se.
Actualmente, a opção por um modelo processual de justiça administrativa faz-se no contexto da evolução já verificada, pois ninguém defende, presentemente, que o processo seja a continuação do procedimento administrativo que gerou o acto, ou que o particular detenha uma mera posição de facto subordinada. Todos reconhecem que o processo administrativo é, essencialmente, um processo jurisdicional e, assim, um litígio entre partes. Todavia, não devemos considerar o objectivismo como pertencente ao passado e o subjectivismo como representante do futuro, pois a actual complexidade de interesses públicos e privados aponta para uma nova legalidade social que impõe uma reacção efectiva contra normas lesivas do interesse público e mecanismos institucionais e colectivos para a sua realização. Neste sentido, concordamos com Vieira de Andrade quando afirma que a opção mais adequada para o legislador talvez seja “uma construção normativa que combine, sem preconceitos, aspectos de ambos os modelos, aproveitando, na medida do possível, as vantagens de cada um” (Cfr. JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, A Justiça Administrativa, 9ª edição, Almedina, pág. 23.). Porém, deve partir-se essencialmente da concepção subjectivista, considerando “o acto administrativo não como objecto do processo, mas como uma actuação da Administração lesiva de um direito do particular que o leva a interpor o recurso” (Cfr. VASCO PEREIRA DA SILVA, Para um Contencioso Administrativo dos Particulares, pág. 144). A doutrina da relação jurídica surge como ponto de partida dogmático capaz de vencer as limitações da doutrina do acto administrativo, pois é um instituto mais amplo, é um conceito-quadro que permite explicar os vínculos jurídicos existentes entre a Administração e os particulares, anteriores e posteriores à prática do acto, assim como aqueles que se estabelecem quando a Administração utiliza formas de actuação distintas.
A relação jurídica não faz desaparecer mas integra o acto administrativo, podendo ser considerada como conceito central do Direito Administrativo, desde que se valorize o procedimento como pano de fundo onde se desenvolvem estas relações jurídicas administrativas. Fazendo um balanço das vantagens e inconvenientes da sua utilização como conceito central, deve dizer-se que corresponde ao modo mais correcto de conceber o relacionamento entre a Administração e os particulares, pois o privado encontra-se perante a Administração, não como um objecto do poder administrativo, mas como um autónomo sujeito jurídico que ocupa uma posição igual à da Administração. Assim, o uso desta dogmática permite colocar a tónica nos direitos individuais e não no poder administrativo, tornando mais forte a posição dos cidadãos, o que constitui uma vantagem.

Portugal
Em Portugal, até 1982/1985, regia o “modelo francês”, em que a regra era o recurso de anulação de actos administrativos, de base objectivista e só em matérias limitadas se admitia um contencioso de plena jurisdição. Assim, a jurisdição administrativa é limitada ao nível substancial (restrição dos meios de acesso), processual (tutela débil dos particulares) e funcional (reduzidos poderes de controlo judicial).
Relativamente aos meios de acesso, o particular tinha que esperar, provocar ou ficcionar (em caso de silêncio da Administração) um acto administrativo para poder recorrer aos órgãos de controlo. Estando em causa direitos subjectivos dos cidadãos que não pudessem ser tutelados pelos meios previstos, restava a hipótese de recurso aos tribunais judiciais. Se os particulares não pudessem invocar direitos subjectivos, remanesciam as garantias políticas e administrativas “graciosas”.
Com a revisão constitucional de 1982 e consequente alteração legislativa de 1984/85 (ETAF e LPTA), entramos num outro período em que é alargado o âmbito do contencioso administrativo e intensificada a protecção dos direitos dos cidadãos. Estas modificações encaminhavam-se no sentido da subjectivização do modelo de justiça administrativa, caminho que, curiosamente, já tinha sido proposto em 1971 num Parecer da Câmara Corporativa que defendia a consagração do direito de recurso contencioso “em caso de lesão de direitos e interesses legítimos por acto da administração pública”. A alteração do modelo reflecte-se principalmente no novo meio de acesso à justiça administrativa, a acção de reconhecimento de direitos ou interesses legalmente protegidos, com a qual se consagra uma tutela jurisdicional de posições jurídicas subjectivas dos particulares e não só o recurso contra actos. Apesar destes avanços, reafirma-se ao mesmo tempo o contencioso contra actos como contencioso-regra e aponta-se a acção de reconhecimento como subsidiária.
No plano processual, é óbvia a preocupação com o purgar das limitações mais chocantes à protecção dos cidadãos (relativamente a actos integrados em diplomas normativos ou confirmativos de actos não comunicados, à invocação indevida da delegação e à ordem de conhecimento dos vícios), equilibrando a posição dos particulares perante os órgãos administrativos: o recurso é menos “um processo feito a um acto” e mais “um processo de partes”. Com o mesmo rumo, consagram-se novos meios acessórios como intimações para consulta de documentos e passagem de certidões.
A reforma profunda do modelo de justiça administrativa português só se inicia com a revisão constitucional de 1989 e culmina com a Reforma de 2002. Consagrou-se, de forma algo encoberta, a garantia constitucional de acesso à justiça administrativa como direito fundamental dos administrados a uma protecção jurisdicional efectiva, pois a tutela dos titulares de posições jurídicas subjectivas não se fazia já só através do recurso contra actos mas sempre que a tutela fosse necessária. Na perspectiva processual, ultrapassaram-se os limites que afectassem desproporcionalmente a protecção judicial dos cidadãos e, no plano funcional, os tribunais administrativos passaram a gozar de todos os poderes normais de condenação e injunção. Pela primeira vez, prevê-se lado a lado a acção de reconhecimento de direitos e o recurso contra actos, o que se pode entender como um afastamento das ideias do recurso contra actos como contencioso-regra e do carácter subsidiário da acção.
A reforma consagrou assim um modelo subjectivista, prevendo o processo administrativo como um processo de partes e alargando os poderes de decisão do juiz perante a Administração. Não se abandonaram, porém, alguns elementos objectivistas, ao nível da legitimidade activa, da previsão de litígios inter-administrativos ou nos expressivos poderes do Ministério Público como auxiliar de justiça.
A Constituição Portuguesa, tratando o indivíduo como sujeito de direito nas relações administrativas, implica a sua consideração como parte no contencioso administrativo (20º/1 e 268º/4 e 5). Temos assim que, na ordem jurídica portuguesa, o particular é visto como titular de situações jurídicas substantivas, ocupando uma posição de parte no contencioso administrativo de anulação ao agir para a defesa dos seus direitos lesados. Pode concluir-se que o contencioso administrativo é, de acordo com a Constituição, um processo de partes, tendo por objecto relações jurídicas administrativas (214º/3). A Lei Fundamental consagra assim a concepção da relação jurídica.

Ana Teresa Faria, n.º 16500, Sub-turma 5

Tarefa 2: legitimidade processual



Tarefa 2: Isto dá que pensar……


A legitimidade processual é o pressuposto processual pelo qual a lei selecciona os sujeitos de cada lide judicial, e devendo ser aferido nos termos em que o autor delineou o respectivo interesse directo e pessoal em impugnar o acto, sendo a sua ocorrência independente da existência real dos factos constitutivos do interesse processual.
O CPTA refere-se à legitimidade processual, designadamente no art. 55º/1, alínea a), onde prevê que tem legitimidade para impugnar um acto administrativo “quem alegue ser titular de um interesse directo e pessoal, por ter sido lesado pelo acto nos seus direitos ou interesses legalmente protegidos; alínea b) o Ministério Público; alínea c) pessoas colectivas públicas e privadas, quanto aos direitos e interesses que lhes cumpra defender; alínea d) órgãos administrativos, relativamente a actos praticados por outros órgãos da mesma pessoa colectiva; alínea e) Presidentes de órgãos colegiais, em relação a actos praticados pelo respectivo órgão, bem como outras autoridades, em defesa da legalidade administrativa, nos casos previstos na lei. Uma concepção de legitimidade, à luz do contencioso administrativo, é aquela que visa conciliar duas relações, uma de cariz material substantivo, e outra de cariz processual, fazendo com que os participantes no recurso sejam os sujeitos efectivos da relação material. Segundo o Prof. Antunes Varela, “ ser parte legítima na acção é ter o poder de dirigir a pretensão deduzida em juízo ou a defesa contra ela oponível. A parte terá legitimidade como autor, se for ela quem juridicamente pode fazer valer a pretensão em face do demandado, admitindo que a pretensão exista, e terá legitimidade como réu, se for a pessoa que juridicamente pode opor-se à procedência da pretensão.
Questão que tem sido debatida pela Doutrina e que está intrinsecamente ligada com o presente tema que nos ocupa, prende-se com a interpretação do art. 57ºCPTA quando se refere aos contra- interessados. Nos termos do preceituado artigo, para além da entidade autora do acto impugnado, são obrigatoriamente demandados os “ contra- interessados a quem o provimento do processo impugnatório possa directamente prejudicar ou que tenham legítimo interesse na manutenção do acto impugnado e que possam ser identificados em função da relação material em causa ou dos documentos contidos no processo administrativo”. A intervenção processual dos contra - interessados sempre foi entendida como sendo uma decorrência do princípio do contraditório e da igualdade das partes uma vez que, sempre que possa haver contra - interessados num processo trilateral( com três partes principais), aqueles devem ter os mesmos direitos e deveres processuais iguais aos da entidade demandada, nomeadamente o direito de contestar, de recorrer e um dever de boa fé processual. Se na acção administrativa comum, os contra- interessados são chamados ao processo conforme a regra geral do art. 10º/1CPTA :” Cada acção deve ser proposta contra a outra parte na relação material controvertida e, quando for caso disso, contra as pessoas ou entidades titulares de interesses contrapostos aos do autor”, na acção administrativa especial o legislador veio dar maior densidade ao conceito de legitimidade passiva dos contra - interessados. É curioso compararmos o conceito de contra - interessados que vigorava na LPTA( Lei de processo nos tribunais administrativos), como “ aqueles a quem o provimento do recurso possa directamente prejudicar”, com o actual, após a reforma do contencioso administrativo, previsto da seguinte forma: aqueles que possam ser identificados em função da relação material em causa ou dos documentos contidos no processo administrativo”.
Na esteira do Professor Vasco Pereira da Silva, o CPTA, ao considerar que, nos processos de impugnação, os sujeitos das relações multilaterais, com interesses coincidentes com os da autoridade autora do acto administrativo, são obrigatoriamente chamados a intervir no processo, está a abrir o contencioso administrativo à protecção desses direitos impropriamente chamados de “ terceiros”. Ora, as relações administrativas multilaterais presentes no Direito Administrativo implicam a revalorização da posição dos “ impropriamente chamados terceiros”, no âmbito do contencioso administrativo. Ao referir-se aos “contra - interessados” e a não definir de forma clara qual o seu papel no processo, o legislador relega tal intervenção para o lado passivo. O autor manifesta, assim, o seu desagrado pela ausência de tratamento, da posição dos “impropriamente chamados terceiros”, para além de não existir, ao nível dos processos de impugnação, uma regulação mais detalhada da sua participação. Parece-me que, actualmente, a redacção do art. 57ºCPTA traz consigo um novo problema de legitimidade processual, que não é de todo despiciendo e que, a meu ver, carece de ser devidamente concretizado pelo legislador.

Ariana Cardoso, nº 15666 subturma 10