Antes da Revolução Francesa de 1789 e da Glorious Revolution de 1688 na Grã-Bretanha o sistema de contencioso administrativo caracterizava-se pela junção numa única entidade, o Rei, das funções administrativa e judicial. De facto o princípio da separação de poderes não era ainda uma realidade pelo que aos particulares, em qualquer litígio com a Administração Pública, não eram reconhecidos quaisquer direitos subjectivos.
Face ao contencioso administrativo francês tem nele amplo impacto a Revolução Francesa de 1789. Apesar de esta ter estado na origem da formulação do princípio da separação de poderes a verdade é que, na prática, o que sucedeu foi a sua negação dado que era a própria Administração que se julgava a si própria não existindo verdadeiros tribunais que, inseridos no poder judicial, se destinassem a julgar a Administração. Tal entendimento era justificado à época pelo facto de o Estado, sendo uma entidade que emanava directamente de todos os cidadãos, não poder ser julgado nos tribunais comuns beneficiando, deste modo, de um privilégio de jurisdição e da sujeição não ao direito comum mas antes ao especial direito administrativo. Em consequência aos particulares não era reconhecida qualquer tutela em eventuais litígios com a Administração.
Igualmente denominado de sistema de administração executiva, o sistema francês caracterizava-se pelo facto de os juízes dos tribunais comuns estarem vedados de conhecer litígios em que uma das partes fosse a Administração. Apesar de em 1799 se terem instituído tribunais administrativos a verdade é que estes estavam inseridos na própria organização administrativa pelo que nunca se verificava um verdadeiro julgamento da Administração. Exemplo de tais tribunais era o Conselho de Estado que, sendo um órgão da Administração, não era imparcial no julgamento da própria Administração em que se inseria.
Em França destacava-se ainda o privilégio da execução prévia da Administração que permitia a esta não apenas executar unilateralmente as suas decisões bem como impor condutas aos particulares sem que lhes seja admissível contraditar as opções da Administração. O principal meio processual era o recurso de anulação mediante o qual o juiz apenas poderia anular certo acto mas nunca lhe permitia condenar a Administração a adoptar certa conduta.
A verdadeira jurisdicionalização do contencioso administrativo ocorre somente quando o Conselho de Estado passou a emitir decisões cuja eficácia não carecia mais de posterior homologação do Chefe de Estado. Apenas neste momento se consagra a verdadeira autonomia dos tribunais administrativos. O passo seguinte foi o de, no próprio texto constitucional, se confirmar o fim da ligação entre os tribunais administrativos e a Administração que acarretou uma mais eficaz protecção dos direitos subjectivos dos particulares. O sistema francês foi exportado para países como a Itália, Alemanha e Portugal.
Já o modelo britânico apresenta distintos traços. Facto fulcral é o diferente entendimento feito do princípio da separação de poderes que se consubstanciava numa efectiva independência e autonomia dos tribunais administrativos que inviabiliza que a Administração seja julgada por órgãos que estejam na sua própria dependência mas antes impõe que a Coroa, enquanto expressão máxima do Estado, se sujeite, tal como os demais cidadãos, à jurisdição comum.
Igualmente relevante para este entendimento é a natureza garantística do “Bill of Rights” de 1689. Aos cidadãos eram reconhecidos direitos subjectivos sendo negados à Administração os privilégios que vigoravam no modelo francês. Em consequência o que existia era um verdadeiro processo de partes no qual vigorava a igualdade entre particulares e Administração.
Contrariamente ao que sucedia no sistema francês não é no modelo britânico admissível que a Administração execute as suas decisões independentemente de os particulares se oporem às mesmas podendo os particulares, sempre em sede de jurisdição comum, contestar a actuação da Administração lesiva dos seus direitos. Consequentemente o poder coactivo de imposição de decisões pela Administração é inexistente. De facto apenas após favorável sentença de um tribunal judicial comum podia a Administração unilateralmente impor as suas decisões.
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